• A culpa como combustível

    Créditos: Carlos Porto / FreeDigitalPhotos.net
    Não há causas confirmadas para a síndrome de cólon irritável. Segundo algumas medicinas alternativas, já nascemos com esta síndrome. No meu caso, o stress foi sempre canalizado para problemas digestivos, o que me leva a admitir alguma verdade nesta ideia.

    Porém, consigo identificar claramente o minuto em que esta condição médica se instalou para ficar. Estava num momento menos feliz da minha vida, com dois empregos a tempo inteiro em duas cidades diferentes, demasiado stress, poucas horas de sono, falta de exercício físico, alimentação deficiente e ausência de momentos de lazer e diversão. Equilíbrio era a palavra que faltava na minha vida.

    Como em todos os momentos em que damos demasiada importância a coisas que não a merecem, Deus mostra-nos o que realmente importa. Um familiar faleceu e uma catadupa de culpas caiu sobre mim.

    Vencida pela invencibilidade do tempo que não volta atrás, chorei como nunca e as dores abdominais desconhecidas gritaram-me “bem-vinda à SCI”.

    Estávamos em agosto de 2008 e o perdão demorou eternidades a chegar. Passados cinco anos, alguma maturidade inevitável e enviada por Deus fez-me perceber que há imensos eventos que escapam à nossa responsabilidade e que são previamente programados para chegarmos onde é suposto. Aprendi também que todos os sentimentos de culpa resultam de um uso deficiente daquilo que fomos feitos, o amor.


    Tal como o egoísmo, a dependência, a obsessão e tantos outros sentimentos menores são rápidos a chegar à nossa mente (se há forças malignas ansiosamente à espera para nos ganharem espaço é uma discussão que não é meu propósito aqui iniciar), a culpa também nos arromba a porta e senta-se no nosso sofá deixando-nos desconfortáveis de pé sem um espaço para descansar.

    A culpa fez-me inconscientemente convencer-me de que merecia sofrer com a doença. E essa culpa atraiu outras culpas: culpa de nunca ter aprendido a lidar com o stress; culpa de tantas vezes optar por ficar em vez de partir por ser mais fácil; culpa de alimentar a minha solidão; culpa das mentiras que fui dando a mim mesma para justificar que havia outras coisas que me impediam de sair quando na verdade apenas me sentia desconfortável com os sintomas da doença; culpa de estar sempre a pensar na doença e de deixá-la controlar o meu dia. Na verdade, a culpa sempre foi um sentimento difícil de encarar e, talvez por isso, no meu caso tenha sido um despoletador da doença.

    Hoje consigo entender que a SCI foi das melhores coisas que me aconteceu. Sou um ser difícil de agarrar por culpas e outros sentimentos limitadores. Hoje sou um ser renovado, mais forte e mais consciente do presente, da volatilidade da vida e das forças que carrego dentro.

0 comentários:

Enviar um comentário